sábado, 17 de fevereiro de 2024

Teia Existencial



"A filosofia de Hegel parece anteceder algumas descobertas da física quântica na descrição da realidade. Para ele, o Universo, as coisas que existem, eu, você, todos nós, não somos um conjunto de corpos, de átomos, ou de partículas subatômicas. 

O universo é uma enorme teia de relações. As coisas (eu, você, todos e tudo) são como uns nós em um rede de pescador, são pontos que só existem pq, antes, há fios que se entrelaçam. A rede, e não os nós, é a realidade autônoma. E ele parece estar certo. 

A modernidade nos apresentou os 104 elementos químicos, que formariam qualquer dos corpos. Depois, estes elementos foram decompostos em átomos. Em seguida, nova dissolução dos átomos em partículas subatômicas, que se decompôs nos quarks, e, finalmente, surge a teoria (ainda não demonstrada experimentalmente) da Supercorda. A corda, que vibrando em várias dimensões, gera as partículas subatômicas. O que existe surge de uma "corda", de uma teia que vibra. Não é a coisa isolada que existe, é a rede de relações. 

Sem ter lido Hegel, sem conhecer a física quântica, o Cacique Seattle parecia já saber disso. Ao responder ao governo americano, que queria comprar suas terras, questionou como poderia vender algo do qual ele, e seu povo, faziam parte? E ensinou ao homem branco: "O homem não teceu a teia da vida – ele é meramente um fio dela. O que quer que ele faça à teia, ele faz a si mesmo". 

Talvez isso é o que queira dizer que "somos todos filhos de um mesmo pai", ou, talvez, amar ao próximo é amar a si mesmo, pois ele faz parte de nós." 

Texto de Ricardo Melo Jr. 

Acrescento: É interessante observar como conceitos filosóficos, como os de Hegel, e ideias provenientes de tradições indígenas, como a do Cacique Seattle, ecoam de certa forma nas descobertas e interpretações da física quântica. Embora essas abordagens possam partir de diferentes contextos culturais e intelectuais, elas convergem em uma compreensão da realidade como uma teia complexa de interconexões, onde a distinção entre sujeito e objeto, entre o observador e o observado, se torna menos nítida. A visão de Hegel sobre o universo como uma rede de relações dinâmicas, onde as coisas individuais derivam sua existência e significado de sua interação dentro de um todo mais amplo, ressoa com a perspectiva da física quântica, que descreve a natureza fundamental da realidade em termos de processos relacionais e interdependentes. Da mesma forma, a sabedoria transmitida pelo Cacique Seattle enfatiza a interconexão entre todas as formas de vida e a responsabilidade compartilhada pela preservação e respeito à teia da vida. Essa perspectiva holística reflete uma compreensão intuitiva da interdependência e da unidade subjacente a todas as coisas, que encontra paralelos nas interpretações mais recentes da física quântica. Assim, mesmo que as linguagens e os contextos variem, essas diferentes tradições de pensamento convergem em uma compreensão profunda da realidade como um todo interconectado, onde as distinções entre sujeito e objeto, entre eu e o outro, se tornam menos rígidas, e onde a ação de um indivíduo reverbera através da teia da existência, afetando a todos.

sábado, 3 de fevereiro de 2024

FIM DOS TEMPOS - TEMPOS DO FIM




Não são poucos hoje que vêem a gravidade dos tempos atuais. Parecem sinais do Fim dos tempos ou dos Tempos do fim. Isso não é aleatório, pois as classes poderosas, dominadoras do mundo pelas armas e pelas finanças, nos têm colocado diante de situações que podem implicar grave afetação da vida humana e da própria biosfera. Não sem razão Noam Chomsky, um dos mais atinados analistas da situação mundial, tem publicado um livro, junto com outros autores com o título:COMO PARAR O RELOGIO DO JUÍZO FINAL, Editora ICL 2023.

Os poderosos sequer dão ouvidos a estas ameaças, pois, isso prejudicaria seus negócio bilionários. Querem que o mundo permanece assim como está, pouco importam as mudanças climáticas, a eventual virosfera, a chegada de novas bactérias que estavam congeladas há milhares de anos sob o parmofrost ou liberadas devido à permanente devastação da natureza.

Eles são obsessionados pelo lucro pessoal ou de suas empresas. Mas é um imperativo ético dos que tomaram consciência dos riscos sob os quais estamos, de alertar a população para estar preparada para eventos extremos (grandes enchentes, ondas de calor insuportável, danos ao agronegócio, grandes queimadas -o piroceno - etc).

Devemos aceitar que a Terra mudou e entrou num outro tipo de comportamento que poderá ser nocivo à vida humana e à natureza. Todos os tomadores de decisões deverão reestudar a configuração das cidades, as margens dos rios e os eventuais grandes deslizamentos de montanhas.

Cada pessoa deve considerar como se defender e preservar seus bens, conquistados com grande sacrifício. Nada mais será como antes.

Quem não tomar seriamente em consideração estas mutações do planeta, se exporá aos danos eventuais dos eventos extremos e da própria vida pessoal e de sua família.

Não temos outra alternativa senão mudar, adaptamo-nos à nova situação, estar vigilantes e ouvir a ciência que nos alertará da vinda de tufões, ventanias, grandes chuvas etc. e como minorar os danos causados.

Preparemo-nos, pois, por amor à vida e à Casa Comum, a Mãe Terra

Boff

segunda-feira, 19 de julho de 2021

quinta-feira, 20 de maio de 2021

Gol de mão é errado, mesmo quando beneficia nosso time

 




"Vocês são verdadeiramente meus discípulos se permanecerem fiéis a meus ensinamentos", diz Jesus. "Então conhecerão a verdade e a verdade os libertará" (Jo 8.31-32). 

A verdade, ao que parece, é o elo entre os ensinos de Jesus e a nossa liberdade. 

Talvez seja por isso que há tanto esforço para tumultuar a verdade, confundir a informação, relativizar a mentira, nivelar fato e opinião, conhecimento e ruído, e tanto apelo por nos manter apaixonados, não pela verdade, mas por uma ideologia ou um político, como numa torcida organizada repetindo o grito de guerra nas arquibancadas. 

"O torcedor real de futebol comemora um gol impedido do seu time e prefere ganhar com gol de mão a perder o campeonato", comparou André Pontes. "A gente não pode levar isso para a política. Primeiro, porque você não pode ter um time. Não pode ter uma paixão na política como tem por seu clube. Não pode achar que, para 'acabar a mamata', vale a pena roubar ou vale a pena acabar com as instituições democráticas." 

Chegamos a um ponto em que é preciso lembrar: desinformar é errado. Espalhar boatos é errado. Agredir jornalistas é errado. Gol de mão é errado, mesmo quando beneficia nosso time.

Na teoria, parece simples: a paixão nos afasta da verdade; a verdade não pertence a partidos ou ideologias; a verdade nos liberta; a mentira nos aprisiona. 

Na prática, contudo, existe um problema sério. Nós gostamos de torcer, de confirmar nossos preconceitos, de encontrar mentiras que confirmem as "nossas verdades", de gritar a cada gol de mão na cadeira cativa das nossas torcidas ideológicas. E há milhões de reais circulando pelas redes sociais com o objetivo de nos manter aprisionados, cantando o grito de guerra, abraçados com os que se alinham conosco, rosnando para os "inimigos", covencidos de que a voz dos lobos é a nossa própria voz - até porque eles aprenderam a falar o nosso linguajar.


ALEXANDRE, Ricardo. E a Verdade Vos Libertará: Reflexões sobre Religião, Política e Bolsonarismo. São Paulo: Mundo Cristão, 2020, p. 223-224.

A Fé nos Lobos

O marketing político — a arte de vestir lobos em pele de ovelha — aprendeu muita coisa a respeito do público evangélico, uma lição que certamente será usada nas próximas eleições.

Aprendeu que os evangélicos são muitos, que estão à venda e que seu preço é baixíssimo: basta que o lobo decore alguns versículos, use alguns termos de nosso vocabulário, prestigie nossos encontros e nos receba nos salões retrofuturistas da Praça dos Três Poderes. 

Aprendeu que os evangélicos são moralistas, mas que seu moralismo é seletivo — ao político que prometer dificultar a vida dos gays e dos maconheiros, permitimos que minta, que devaste nossas florestas, que corrompa nossa democracia, que zombe de nossos mortos. 

Aprendeu que nossos pastores podem ser cabos eleitorais eficientes e obedientes, que podemos espalhar mentiras nos grupos de WhatsApp das igrejas e até boatos nos púlpitos. 

Aprendeu que podemos trocar a lucidez de Jesus pelo emocionalismo de uma disputa entre personagens públicos baseada na propaganda. 

Que, em nome de uma ideologia, podemos relativizar a violência e a intimidação contra jornalistas e seus familiares. 

Aprendeu que podemos diminuir  o nome de Deus até que ele caiba numa disputa eleitoral —mesmo que seja uma disputa repleta de raiva, ódio e mentira. 

Aprendeu que, mais que confundir lobos com ovelhas, a igreja evangélica pode até mesmo se oferecer aos lobos famintos. 






ALEXANDRE, Ricardo. E a Verdade Vos Libertará: Reflexões sobre Religião, Política e Bolsonarismo. São Paulo: Mundo Cristão, 2020, p. 223-224.